FALAR É FACIL. FAZER...


Na esteira das comemorações dos 27 anos do Partido dos Trabalhadores, o Bom Dia de ontem estampou: "Diretório apaga memória sobre fundação do PT em Rio Preto". Segundo o jornal, "a única maneira de resgatar essa história é a partir de relatos dos primeiros membros".

Para comprovar sua tese, a reportagem saiu a campo e coletou os depoimentos de Ademar Bartolomei (Cavaco), Romildo Sant’Anna (à direita na foto) e Cacau Lopes (à esquerda na foto).

Ao lado de Jamil Jubi Barbur, José Carlos Galvão, Hélio Calhado e Hélio Alves, Cavaco foi um dos fundadores do partido na cidade. Desfiliado desde 2002, Bartolomei entende que o surgimento do PT atendia ao romântismo da juventude:“Quando a militância surgiu, éramos jovens românticos cheios de ideais de transformação social. Hoje, o PT tem profissionais da política e não militantes”.

Considerando a parca profssionalização do PT neste sertão de Iboruna - tendo em vista o que é usualmente praticado pela "concorrência" local (PSDB, PD - ex-PFL -, PPS, PMDB, PDT...) -, a versão de Cavaco, certamente, se fundamenta a partir de fatos nacionais.

Candidato à vice-prefeito pelo PT, em 1982, na chapa de José Carlos da Costa Bueno, Bartolomei militou no partido por mais de 20 anos, sendo membro titular do Diretório Municipal por diversas vezes.

Para o professor Romildo Sant'Anna, ser petista na cidade "era um fetiche", isto é, "um símbolo de ideal político". Sant'Anna ressalta o amadorismo e voluntarismo da militância: "Nós dependíamos da contribuição dos militantes. Fazíamos churrascos e festas para arrecadar fundos", afirma.

Sant'Anna militou no PT por mais de 10 anos. Em 1988, foi candidato a vice-prefeito, ao lado de Cacau Lopes.

Cacau Lopes, foi candidato à prefeito e vereador por duas vezes pelo PT. Hoje no PV (Partido Verde), Lopes militou por mais de duas décadas no PT, tendo se desfiliado em 2004: “Saí porque as coisas eram decididas de cima para baixo, sem o diálogo pluralista que havia no começo”, conforme traz o Bom Dia.

Na verdade, a saída de Lopes se deu no exato momento que os petistas de Rio Preto, em sua ampla maioria, não aceitaram submeter a autonomia partido às vontades de Edinho Araújo (PPS). Rompida a aliança, Lopes optou pelo barco governista e deixou o PT num dos instantes mais críticos de sua história.

Pois bem, se a tese do jornal estiver realmente correta - "Diretório apaga memória sobre fundação do PT em Rio Preto" - cabe perguntar aos 3 ex-petistas, Cavaco, Sant'Anna e Lopes, o que eles fizeram para preservar a memória do partido?

Afinal, pela relevância dos postos que ocuparam ou mesmo pelos vários anos de militância, seria lícito imaginar que tenham se ocupado, de alguma forma, em registrar e preservar a história do PT na cidade. Ou não?

Do mesmo modo, se o Diretório Municipal "apagou" a memória do PT, como afrima a matéria, logo, como membros do Diretório durante anos, Cavaco, Sant'Anna e Lopes também são co-responsáveis pela ausência de fontes sobre o período de fundação do partido em Rio Preto. Ou não?

Talvez, tal ausência dê a exata medida de tanto amadorismo e boemia dos petistas ao longo dos anos.

Diz Lopes, a respeito dos comícios do partido na década de 80: "Quando chegava minha vez de discursar não sobrava ninguém para ouvir. Só umas duas pessoas. Daí eu descia do palanque e os convidava para um chope".

O amadorismo nostalgicamente entoado como virtude pelos 3 ex-petistas - e por outros mais, não entrevistados pela reportagem - permitiu ao partido crescer sem organizar corretamente seus arquivos e, pior, sua história.

Aliás, durante o período em que o PT esteve sob hegemonia de Lopes, no final dos anos 90, o partido não dispunha sequer de uma sede. Objetos e documentos do PT permaneceram anos amontados num quartinho que havia nos fundos do prédio da antiga sub-sede da CUT (Central Única dos Trabalhadores) em Rio Preto.

Episódios como este ajudam a explicar o fato de não haver qualquer estudo ou publicação de relevância sobre a atuação do PT na cidade. Certamente, não deve ser por falta de fatos, personagens e estórias...

Por outro lado, também convém destacar que o descaso com a história não é propriamente uma exclusividade dos petistas. Esta é uma característica pelicular desta cidade que já demoliu sua catedral por algumas vezes e que, nas palavras do historiador Agostinho Brandi, "nunca teve preocupação com o seu patrimônio histórico" (ver post de 2/2).

Nesse sentido, é preciso reconhecer o esforço dos petistas, que, segundo o presidente do Diretório Municipal, Ailton Bertoni, resguardaram a documentação dos últimos 13 anos da vida do partido na cidade. Quantos partidos em Rio Preto demonstrariam igual proeza? Quem sabe o velho PCB (Partido Comunista Brasileiro) de Antônio Roberto Vasconcelos (Vasco)...

De fato, seria interessante ver uma reportagem similar com os demais partidos instalados nestas terras de Iboruna. Quantos têm sede permanente? Onde estão seus arquivos? Será que o Bom Dia se dispõe a efetuar este levantamento?

Portanto, o vereador petista João Paulo Rillo parece ter razão quando afirma que o "PT continua sendo o partido de maior organização e pluralidade na cidade".

Por sua vez, o Bom Dia deveria evitar manchetes imperativas - e errôneas -, incluindo tal comportamento em seu manual de redação.

Quanto aos ex-petistas, Cavaco, Sant'Anna e Lopes, realmente fica a impressão de que falar é fácil. Fazer...