POR ORDEM DO IMPERADOR, FUNDADA PELA INICIATIVA PRIVADA, COM AS BENÇÃOS DE SÃO JOSÉ


A versão oficial não traz, mas João Bernardino de Seixas Ribeiro, aclamado fundador de Rio Preto, "era concessionário de uma sesmaria obtida por ordem régia".

Mineiro da região da atual cidade de Ouro Preto, João Bernardino recebeu a concessão de terras numa área conhecida como "campos de Araraquares, na região oeste da província de São Paulo".

Como se sabe, o ciclo do ouro nas Minas Gerais, iniciado ainda no começo do século 18, demostrava sinais de saturação já em meados do 19 , propiciando um ambiente favorável à migração de mineiros abastados e/ou aventureiros rumo a novas terras.


Não bastasse o esgotamento econômico, havia também o político. Era o fim da Regência (1831-1840) - iniciada com a abdicação de D. Pedro, em 7 de abril - e o início do 2° Reinado (1840-1889). A maioridade de D. Pedro II esperava encerrar um dos períodos mais agitados da história do país, almejando a integração do país a partir da figura do Imperador e da expansão para o sertão.

Apenas para relembrar, durante a Regência ocorreram as chamadas "revoltas regenciais", com destaque para a Cabanagem (1833-136), no Pará; a Farroupilha (1835-1845), no Rio Grande; a Sabinada (1837-1838), na Bahia; e a Balaiada (1838-1841), no Maranhão.

Pois bem, por volta de 1840, João Bernardino de Seixas Ribeiro migrou para o sertão de Iboruna, até então praticamente inexplorado, iniciando, por assim dizer, a empresa privada nos campos dos Araraquares.

Sim, porque a sesmaria continha em sua essencia o que hoje é o termo geral de qualquer concessão pública, isto é, quando o Estado cede a um ente privado o direito de explorar determinado bem público. Princípio similar também pôde ser visto nas capitânias hereditárias ou mesmo nas encomiendas utilizadas pelo espanhóis na exploração da prata aqui na América (Celso Furtado. Formação Econômica da América Latina, 2ª ed., 1970).

Portanto, assim como outras tantas do mesmo período, a concessão de João Bernardino visava atender a interesses distintos, porém convergentes. De um lado, o Imperador tentando criar uma nação, de outro, um mineiro em busca de terras - leia-se fortuna - e certamente disposto a boas doses de aventura, muito próximo do "tipo ideal" do aventureiro ibérico descrito por Sérgio Buarque de Holanda (Raízes do Brasil, 1ª ed., 1936).

Mas como diz Eduardo Galeano (As Veias Abertas da América Latina, 1ª ed., 1970), neste continente a espada e a cruz realizaram juntas a tarefa de extrair - à força - uma civilização de tipo ocidental. E Rio Preto não fugiu a regra.

Embora tenha construído a primeira casa de sapé, oficialmente João Bernardino divide o posto de fundador de Rio Preto com Luiz Antônio da Silveira. Isto porque as terras do patrimônio de São José, que deram origem à cidade, foram doadas à Igreja por Silveira e sua mulher, Tereza Francisca de Jesus, com a escritura lavrada em Araraquara no dia do santo de devoção do casal, em 19 de março de 1852 (Cavenaghi, 2003).

João Bernardino, que havia construído sua casinha de sapé nas terras do patrimônio de São José, como bom mineiro, tratou logo de reunir os moradores das vizinhanças para erguer um cruzeiro de madeira e, depois, uma pequena capela.

Pronto. Estado, empresa privada e Igreja unidos, sem contradições aprentes. Coisa de mineiro... Por tal proeza, João Bernardino de Seixas Ribeiro bem merece o título de fundador.

Em resumo, por ordem do Imperador, Rio Preto foi fundada pela iniciativa privada, com as bençãos de São José.